Este estudo do Evangelho baseia-se na contemplação do texto (2 Cor 3,1-18). Esta passagem da Escritura desenvolve o ministério da Nova Aliança, a que Paulo chama o ministério do Espírito, em contraste com o ministério da Antiga Aliança, o da Lei. Aqueles que foram ordenados receberam o ministério do Espírito e são portadores desse ministério: um ministério de verdade, de liberdade, que reflecte e torna presente Cristo ressuscitado. O Espírito Santo é aquele que nos permite exercer e desenvolver este ministério.
O ministério do Espírito é o ministério da Nova Aliança. Realiza-se num contexto completamente novo. Vai muito para além das mediações exteriores: vítimas, sacrifícios, lei. Centra tudo na relação com Deus. Esta relação é possível graças à ação do Espírito enviado pelo Pai para fazer novas todas as coisas.
I - O ministério do Espírito
Luz e proximidade do Pai
O ministério do Espírito é o ministério da Nova Aliança. Através do Espírito, temos acesso a Deus. Através da morte e ressurreição de Cristo, ele remove o véu que escondia a presença de Deus e impedia a comunicação com ele: "Até hoje, quando lemos o Antigo Testamento, o véu permanece. Não é levantado, pois é Cristo que o retira. Sim, até hoje, quando se lê Moisés, um véu é colocado sobre os seus corações". (2 Cor 3,14-15). A ressurreição de Jesus Cristo levanta o véu que esconde a luz e revela a proximidade de Deus para connosco. Através do ministério do Espírito, temos acesso a Deus tal como Jesus, que é a revelação e a transparência do Pai: "Então Jesus deu outro grito e expirou. E a cortina do Templo rasgou-se em duas, de alto a baixo. A terra tremeu. As rochas fenderam-se. Os túmulos abriram-se e muitos corpos de santos que tinham morrido ressuscitaram. Depois da ressurreição, eles saíram dos túmulos, entraram na Cidade Santa e mostraram-se a muita gente". (Mt 27,50-53). É este o dinamismo, a novidade que incorpora o ministério do Espírito na vida da Igreja, no próprio exercício deste ministério em que participamos e que nos foi confiado. O Espírito renova tudo. Ele faz novas todas as coisas. É para ele que devemos apontar através de todas as mediações necessárias, mas relativas. É o Espírito que nos põe em relação, em comunicação com Deus de uma forma próxima e transparente. Os medos são dissipados. Deus torna-se próximo, familiar e amável.
Refletir a glória de Cristo
Jesus Cristo, tendo levantado, pela sua morte e ressurreição, o véu que escondia o rosto e a presença de Deus, nós podemos, por nossa vez, com o rosto descoberto, refletir a própria glória de Cristo. É isto que o Espírito Santo realiza em nós: o que nós próprios somos chamados a refletir ao tornarmo-nos parte do seu ministério: "Todos nós que, com o rosto descoberto, reflectimos a glória do Senhor como num espelho, somos transformados nessa mesma imagem, cada vez mais gloriosa, como convém à ação do Senhor que é Espírito". (2 Cor 3,18). O Espírito Santo transforma-nos à imagem de Cristo. É o Espírito Santo que faz Cristo habitar em nós, que torna o nosso ser semelhante ao ser de Cristo e que remete tudo para ele: "O Espírito da verdade, que o mundo não pode receber, porque não o vê nem o conhece. Vós o conheceis porque ele habita convosco e está em vós". (Jo 14,17). Através deste sopro e deste ministério do Espírito Santo, conhecemos Jesus Cristo e somos chamados a dá-lo a conhecer.
Dar a conhecer Jesus Cristo
É o Espírito que dá a conhecer Jesus Cristo, que dá testemunho dele, que é a testemunha principal, em quem devemos acreditar: "Quando vier o Paráclito, que eu vos enviarei da parte do Pai, o Espírito da verdade que vem do Pai, ele dará testemunho de mim. E vós também dareis testemunho, porque estais comigo desde o princípio". (Jo 15,26-27). Ele é o primeiro a revelar-nos quem é Jesus, toda a verdade: "Quando ele, o Espírito da verdade, vier, conduzir-vos-á a toda a verdade, porque não falará por si mesmo, mas dirá e anunciará tudo o que ouvir. Ele glorificar-me-á, porque receberá do meu bem e o partilhará convosco". (Jo 16,13-14). O Espírito Santo é, antes de mais, o Espírito da verdade. Ele conduz-nos à verdade. Nós somos portadores de um ministério da verdade. A verdade é Cristo, o Filho que vive para fazer a vontade do Pai e que, n'Ele, encontra a sua liberdade e a sua grandeza. Seguir Cristo é conhecer a verdade, viver na verdade como o caminho que conduz o homem ao seu pleno desenvolvimento e realiza os seus desejos mais profundos: "Se permanecerdes na minha palavra, sereis verdadeiramente meus discípulos, conhecereis a verdade e a verdade vos libertará". (Jo 8,31-32; 14,6; 18,37-38).
O Espírito Santo é também aquele que nos envolve na sua missão de dar a conhecer Jesus Cristo. É uma missão sublime. É uma graça que nos faz transbordar de gratidão: "Graças a Deus que, em Cristo, nos conduz no seu triunfo e que, através de nós, difunde por toda a parte o perfume do seu conhecimento". (2 Cor 2,14). O conhecimento de Jesus Cristo é o sopro, o bom odor da vida que dá vida. Este conhecimento de Jesus Cristo é um dos bens messiânicos produzidos pelo Espírito do Senhor que vem sobre o tronco de Jessé, sobre o Messias: "Não haverá mais mal nem destruição em todo o meu santo monte, porque a terra está cheia do conhecimento de Javé, como as águas enchem o mar". (Is 11,1-9).
O Espírito sabe tudo, sonda tudo, penetra tudo até às profundezas de Deus. É por isso que o conhecimento de Jesus Cristo é tão importante, porque é obra do Espírito Santo: "Ninguém conhece os segredos de Deus senão o Espírito de Deus. Ora, nós não recebemos o espírito do mundo, mas o Espírito que vem de Deus, para conhecermos os dons que Deus nos concedeu. E nós falamo-la, não em linguagem de sabedoria humana, mas no Espírito". (1 Cor 2,10-16).
O Padre Chevrier recebeu uma luz que o fez descobrir que o ponto de partida para tudo é conhecer Jesus Cristo e ter o Espírito de Deus: "Conhecer Jesus Cristo é tudo". (VD 113; 103, nota 1). "Ter o Espírito de Deus é tudo". (VD 511). Como é que acolhemos o Espírito Santo e nos deixamos guiar por Ele? Somos verdadeiramente homens cheios de fé e do Espírito Santo, como se exigia daqueles que eram escolhidos para exercer um ministério nas primeiras comunidades cristãs? Experimentamos como uma luta a tensão entre o espírito do mundo que se insinua em toda a nossa vida e o sopro e a força do Espírito Santo que habita em nós e que nos foi efetivamente dado com o ministério que recebemos? Pois é o Espírito da verdade que realiza verdadeiramente as nossas aspirações de nos tornarmos pessoas verdadeiramente livres.
Ministério da Liberdade
O ministério do Espírito é um ministério de liberdade. A sua ação não se baseia na submissão à força da lei, mas no amor e na gratuidade. O Espírito Santo torna-nos verdadeiramente livres. Este é o grande desafio que enfrentamos no mundo atual: testemunhar que a fé cristã é fonte de alegria e de liberdade. A novidade da fé coloca-nos neste clima: "Na posse de uma tal esperança, comportamo-nos com grande confiança e não como Moisés, que pôs um véu sobre o rosto para impedir que os filhos de Israel vissem o fim do que era temporário". (2 Cor 3,12-13). A lei foi um instrumento pedagógico válido, mas obscureceu o acesso a um encontro pleno com Deus na alegria e na liberdade. O Espírito rasga o véu e permite-nos experimentar a liberdade do amor. Para nós, a conversão é o salto do Antigo Testamento para o Novo Testamento: "É quando nos convertemos ao Senhor que o véu cai, porque o Senhor é o Espírito, e onde está o Espírito do Senhor, aí está a liberdade". (2 Cor 2,16-17).
Como viver e transmitir esta experiência de que o ministério do Espírito, que nos foi confiado, nos torna verdadeiramente livres e faz nascer a nova criação, a nova humanidade? Não estamos a falar de uma liberdade caprichosa que regularia a nossa vida segundo os nossos próprios desejos e os desejos da velha humanidade. Isso seria cair na escravidão, numa tentação constante (Gl 3,1-5), apesar de termos sido libertados por Cristo. "Cristo libertou-nos para que possamos permanecer livres. Por isso, mantém-te firme e não te submetas ao jugo da escravidão". (Gal 5,1). O caminho da verdadeira liberdade, que é o caminho da verdade, não é fácil. Está cheio de falsos profetas, encantadores que seduzem sob a aparência de liberdade, mas que, no fim, conduzem à escravidão, porque enganam e semeiam laços.
A verdadeira liberdade é inseparável da verdade que é o próprio Cristo, palavra viva do Pai: "Se permanecerdes na minha palavra, sereis verdadeiramente meus discípulos. Então conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará. (Jo 8,31-32). Estamos conscientes de que viver na verdade e alcançar a liberdade é um caminho disputado, cheio de dificuldades e contradições. O Espírito da verdade está em conflito com o espírito do mundo, que é geralmente seduzido pela mentira.
Na Cruz e na contradição
Quem se deixa conduzir pelo Espírito Santo entra em conflito e tensão com o mundo, com aquilo a que poderíamos chamar "a carne" (Gl 5,16-18). Jesus, conduzido pelo Espírito, anuncia a Boa Nova na sinagoga de Nazaré. O que o Espírito o leva a proclamar desencadeia um conflito com os seus compatriotas. A novidade do Espírito opõe-se à lei e ao espírito do mundo: "Ele levantou-se. Empurraram-no para fora da cidade e levaram-no para um penhasco na colina sobre a qual a cidade estava construída, e atiraram-no para baixo". (Lc 4,29).
O Espírito perscruta tudo, ilumina tudo, até o mais secreto e oculto. Ele revela as intenções ocultas. É por isso que a velha humanidade não se abre facilmente ao Espírito da verdade. Pelo contrário, muitas vezes afugenta-o e tenta extingui-lo em si e à sua volta: "O homem, por natureza, não aceita o que vem do Espírito de Deus. É loucura para ele e não pode conhecê-la, pois é pelo Espírito que ela é julgada". (1 Cor 2,14). Mas foi-nos dado o dom de ver as coisas com a mente e os olhos do Espírito, com a mente e a mentalidade de Deus, que tanto contrasta com o espírito do mundo: "O homem espiritual julga tudo e não está sujeito ao julgamento de ninguém. Quem, pois, conheceu a mente do Senhor para o ensinar? E nós temos a mente de Cristo. (1 Cor 2,15-16).
Tal como Jesus, estes mensageiros de Jesus encontraram resistência à ação do Espírito Santo. A obediência da fé é essencial. A obediência da fé é essencial. Da mesma forma, a fidelidade do Filho à Palavra do Pai, pois o Filho é possuído pelo Espírito Santo que o leva a cumprir a missão que lhe foi confiada (Lc 4,1-13). Desde o início, a missão de Jesus fez o seu caminho no meio do confronto com o mundo, entre aqueles que resistem a acreditar n'Aquele que o Pai enviou: "Quem acredita nele não é julgado. Aquele que não acredita já foi julgado, porque não acreditou no nome do Filho único de Deus. O julgamento é este: a luz veio ao mundo e os homens preferiram as trevas à luz, porque as suas acções eram más. (Jo 3,18-19). O Espírito Santo é aquele que nos conduz a toda a verdade, que ilumina todas as trevas, que traz tudo à luz. A resistência surge em nós porque não aceitamos esta verdade, porque nos protegemos na nossa própria fortaleza. É por isso que o ministério do Espírito, que constitui o profeta, vai deparar-se com a tensão, a cruz, o conflito: "Quando ele vier, o Espírito da verdade, confundirá o mundo em matéria de pecado, de justiça e de juízo: de pecado, porque não crêem em mim; de justiça, porque vou para o Pai e não me vereis mais; de juízo, porque o príncipe deste mundo está condenado". (Jo 16,8-11).
Esta é a grande obra do Espírito Santo. Também nós nos tornámos portadores do seu ministério, não por nós próprios, evidentemente, não por nossa própria iniciativa, mas por escolha e chamamento de Deus. Este ministério está para além de nós e não somos capazes de o realizar. É ele que, pela sua presença contínua e pela ordenação, nos capacita para este serviço sublime.
II - Deus torna-nos aptos para o ministério da Nova Aliança
Este ministério do Espírito é um dom. Ninguém o pode dar a si mesmo com base nas suas qualidades, virtudes ou méritos. É o Espírito que nos faz e nos constitui ministros da Nova Aliança. Não é, portanto, uma função que alguém possa exercer por sua própria iniciativa ou decisão, ou por pertencer a uma tribo ou família sacerdotal: "Não, foi Deus que nos qualificou para sermos ministros da Nova Aliança, não da letra, mas do Espírito, porque a letra mata, mas o Espírito dá vida". (2 Cor 3,5-6).
Nós, que recebemos o ministério da Nova Aliança, pertencemos ao Espírito de Deus. Ele é a fonte e a alma do nosso ministério. Ele torna possível uma relação pessoal e viva com a Trindade. Ele ajuda-nos a ultrapassar a tendência para ritualizar o ministério e os acontecimentos religiosos, como acontecia no Antigo Testamento.
O Espírito qualifica Jesus e os apóstolos para a missão
No início do seu ministério, Jesus fica cheio do Espírito Santo e, ao fazê-lo, cumpre a missão que lhe foi confiada pelo Pai de anunciar e tornar presente o seu Reino, que é uma Boa Nova para todos, especialmente para os pobres.
Os inícios do ministério de Jesus apresentam-se-nos como uma efusão do Espírito na sua pessoa e na sua ação apostólica. São exemplos claros disso o batismo no Jordão (Lc 3,21-22), as tentações no deserto (Lc 4,1) e o primeiro discurso na sinagoga de Nazaré (Lc 4,14-19). Todo o abundante ministério exorcista de Jesus, que depois confiou aos discípulos, reflecte esta realidade: Jesus foi possuído pelo Espírito de Deus e venceu o espírito do mal, os espíritos malignos, mostrando assim que o Reino de Deus já estava em ação: "Se eu expulso os demónios com o dedo de Deus, então chegou para vós o Reino de Deus". (Lc 11,20).
No Pentecostes, os apóstolos receberam o dom do Espírito Santo (Actos 2,1-13). Os apóstolos confiaram o ministério a pessoas escolhidas, através da imposição das mãos, pelas quais receberam o dom do Espírito Santo, como aconteceu com Saulo: "Então Ananias saiu, entrou em casa, impôs as mãos sobre Saulo e disse-lhe: "Saulo, meu irmão, quem me enviou é o Senhor, o Jesus que te apareceu no caminho por onde vinhas. E isto é para que recuperes a vista e fiques cheio do Espírito Santo". (Actos 9,17; 6,6; 13,2-3; 1Tm 4,14; 2Tm 1,6).
Portadores do ministério do Espírito
O Espírito Santo que recebemos permite-nos entrar em comunhão com Jesus Cristo e com o Pai, e ver tudo com os olhos e a mentalidade de Deus. É o Espírito que nos transforma verdadeiramente em Cristo e nos permite torná-lo presente no mundo de hoje, mesmo que não seja facilmente acolhido ou percepcionado. "O homem não aceita naturalmente o que é do Espírito de Deus: é loucura para ele e não deve conhecê-lo, pois é pelo Espírito que ele é julgado. O homem espiritual, pelo contrário, julga tudo e não está sujeito ao julgamento de ninguém. Quem, pois, conheceu o pensamento do Senhor para lhe dar uma lição? E nós temos o pensamento do Cristo. (1 Cor 2,14-16).
Possuídos pelo Espírito Santo, temos o espírito de Cristo e estamos em plena comunhão com ele. É o Espírito que nos permite exercer o nosso ministério. É também o Espírito que leva a cabo toda uma ação de recriação e de transformação do coração do homem e do mundo. Esta é a grande novidade da aliança que Deus selou com a humanidade em Cristo, pelo Espírito: "A nossa carta sois vós. Uma carta escrita nos nossos corações, conhecida e lida por todos os homens. Sim, sois claramente uma carta de Cristo escrita por nós, escrita não com tinta, mas com o Espírito de Deus vivo, não em tábuas de pedra, mas em tábuas de carne, nos vossos corações". (2 Cor 3,2-3; Jer 31,31-34). Como acolhemos e reconvertemos a ação do Espírito em nós, nos pobres, no ambiente e no mundo em que vivemos? Vemo-nos como uma obra escrita pelo Espírito Santo que reflecte a sua ação criadora neste mundo e neste tempo?
Somos ministros de uma Palavra que não é nossa. Foi o Espírito que escreveu esta Palavra no coração das pessoas, não na pedra, nem sequer num livro. Somos chamados a ler, a aprender a ler o que o Espírito escreveu no coração das pessoas. Esta Palavra, que o Espírito torna presente, é o Verbo, Jesus Cristo ressuscitado. Esta Palavra excelente ultrapassa a do Antigo Testamento: de facto, é o próprio Filho, ou seja, tudo o que o Pai quis comunicar. Deste modo, a lei é superada e entramos num encontro pessoal vivido na fé e no amor. Esta é a grande novidade: "Se o ministério da morte, gravado em letras sobre pedras, estava rodeado de uma tal glória que os filhos de Israel não podiam olhar para o rosto de Moisés por causa da glória, ainda que fugaz, desse rosto, como é que o ministério do Espírito não saberia mais?" (2 Cor 3,7-9).
A palavra que proclamamos não se baseia na eloquência, nem na capacidade de reflexão, nem na retórica de um discurso bem elaborado, bem construído, mas na ação do Espírito, nesse fundamento sólido que é o próprio Deus, em quem depositamos a nossa confiança e de quem nos vem o dom da fé: "A minha palavra e a minha mensagem não eram discursos persuasivos de sabedoria. Foi uma demonstração do Espírito e do poder, para que a nossa fé não se apoiasse na sabedoria dos homens, mas no poder de Deus. (1 Cor 2,4-15).
Mas uma missão tão sublime é verdadeiramente desproporcionada em relação à nossa pobreza e fragilidade. O ministério foi-nos dado. É o dom de Deus que nos renova e transforma pelo dinamismo do Espírito: "Quem está à altura de tal tarefa? Nós não somos como a maioria das pessoas que adulteram a Palavra de Deus. Não, como homens sinceros, como enviados de Deus, falamos diante de Deus em Cristo. (2 Cor 2,16-17). O verdadeiro ator é o Espírito. Nós somos apenas servos, colaboradores da sua ação criadora.
III - Apoiar a ação do Espírito
Quanto a nós, foi-nos confiado o ministério do Espírito. O Senhor quis continuar a sua obra através da ação e da presença do Espírito Santo em nós. Por isso, o nosso ministério traz em si o dinamismo do Espírito e a capacidade de produzir os seus frutos, conscientes de que não somos nós que os produzimos, mas o próprio Espírito de Deus: ao ressuscitar Jesus dos mortos, o Espírito faz novas todas as coisas: "Assim, já não conhecemos ninguém segundo a carne. Mesmo que tenhamos conhecido Cristo, já não o conhecemos desse modo. Mas, se alguém está em Cristo, é uma nova criatura: o velho se foi, o novo veio. (2 Cor 5,17; Is 43,18-19).
Através de nós, e em nós, o Espírito continua o ministério iniciado em Jesus, seu ungido, cuja irrupção neste mundo instaura a novidade do Reino de Deus. Impelido pelo Espírito de que estava cheio, Jesus continuou o seu ministério na Galileia, anunciando a Boa Nova, provocando admiração e também perplexidade e hostilidade perante a proposta inovadora e desconcertante do seu anúncio, que desafiava a religiosidade da Lei e do Templo, para revelar um Deus presente e atuante sobretudo a favor dos pobres e excluídos (Lc 4,14-30; Jo 3,5-8; Jo 4,21-24).
O novo sistema de justiça
O Messias é um homem possuído pelo Espírito de Deus. É ele que restabelece a nova justiça, a justiça do Reino, a justiça que vela pelos direitos dos pobres e dos marginalizados, a justiça que exalta os fracos e os indefesos: "O Espírito de Javé repousará sobre ele... julgará com justiça e retidão os fracos e os pobres da terra". (Is 11,2-5; Sl 72,3-4; 12-14). A nova justiça é sobretudo a defesa dos humildes, dos marginalizados e dos esquecidos, daqueles que não têm oportunidades. Não se limita aos parâmetros do sistema jurídico e à mentalidade da época. Abre-se a novos horizontes, aqueles que o próprio Deus imprimiu na condição humana, e que são a sua própria imagem (Mt 25,31-46). O Espírito que habita em nós impele-nos também a promover esta justiça e a trabalhar para a tornar efectiva nas relações humanas, como sublinha Jesus na parábola dos trabalhadores da vinha: "Chama os trabalhadores e dá a cada um o seu salário, do último ao primeiro". (Mt 20,1-16).
A justiça do Reino tem o amor como veste e a misericórdia como coração. Foi assim que Jesus reagiu aos julgamentos rápidos dos judeus em certos meios e também a certos comportamentos pessoais. Os fariseus escandalizam-se por verem Jesus acolher os publicanos e os pecadores e comer com eles. Isso era proibido pela lei. O Espírito vê mais longe do que a lei e chega ao mais profundo do homem para o salvar: "Por que come o vosso mestre com os publicanos e os pecadores?"... Ide e aprendei o que significa "quero misericórdia e não sacrifício". "Eu não vim chamar os justos, mas os pecadores". (Mt 9,11-13). Reagiu da mesma forma contra aqueles que pretendiam julgar a adúltera. Jesus mostra-lhes como é cega e injusta a sua forma de exercer a justiça e propõe uma nova justiça, a da misericórdia, do perdão e do arrependimento: "Mulher, ninguém te condenou? ... Eu também não te condeno. Vai agora. E, de agora em diante, não pesques mais". (Jo 8,1-11; Mt 9,13; 12,7). A nova justiça, inspirada pelo Espírito, é a das bem-aventuranças. Ela ultrapassa a dos escribas e fariseus: "Digo-vos que, se a vossa justiça não exceder a dos escribas e fariseus, de modo algum entrareis no reino dos céus". (Mt 5,20).
É este o ministério do Espírito que recebemos: é este o ministério que realiza a nova justiça que deve tomar o seu lugar na sociedade através da vida e do testemunho das comunidades cristãs: amor e defesa dos pobres e dos mais pequenos, misericórdia: é este o caminho que o Espírito de Deus nos conduz. Este é, de facto, o ministério que recebemos e ao qual dedicámos a nossa vida para trabalharmos juntos para fazer emergir a fraternidade e a reconciliação.
Reconciliação
Este é outro fruto do Espírito, do Reino Messiânico. O Espírito rompe as fronteiras. Ele é capaz de criar harmonia e reconciliação entre aqueles que parecem decididos a opor-se e a confrontar-se. Para ele, a reconciliação é uma nova criação, que ilumina o novo Adão, o Cristo ressuscitado, e nos torna a todos filhos de Deus e irmãos uns dos outros: "A criação que espera anseia pela revelação dos filhos de Deus... Toda a criação geme em trabalho de parto até hoje. Nós próprios, que possuímos as primícias do Espírito, também gememos interiormente, aguardando a redenção do nosso corpo". (Romanos 8:19-23).
O Espírito que anima toda a obra criadora ilumina a nova humanidade, derrubando o muro da separação e reunindo num só povo a diversidade e a multidão dos povos que compreendem a linguagem do Espírito: "Pois ele é a nossa paz, que fez dos dois um só povo, derrubando as barreiras que os separavam... para que, na sua pessoa, criasse os dois num só homem novo. E, fazendo a paz, reconciliou ambos com Deus num só corpo... Por ele, ambos têm livre acesso ao Pai no mesmo Espírito". (Ef 2,14-18). O Espírito que une o Pai e o Filho é aquele que torna possível a unidade do género humano na sua rica diversidade. Um reflexo disso é-nos dado no Pentecostes, onde pessoas de todo o mundo então conhecido ouviram, cada uma na sua própria língua, a mesma mensagem de unidade (Actos 2,1-13).
O Espírito conduz-nos por caminhos de reconciliação, de perdão, de harmonia e de unidade entre as pessoas e os povos, superando o confronto, o ódio, a sede de poder e a opressão, numa palavra, o poder do pecado, porque é o pecado que danifica e destrói a criação. O profeta Isaías anuncia e prevê os tempos messiânicos em que o Espírito pacificará e reconciliará a criação: "O lobo habitará com o cordeiro, o leopardo deitar-se-á com o camelo... o leão comerá palha como o boi... Não haverá mais mal nem destruição em todo o meu santo monte, porque a terra se encherá do conhecimento de Javé como as águas enchem o mar". (Is 11,1-9).
Esta é a grande missão que Deus nos confiou: sermos ministros da reconciliação, apoiar a ação criadora, unificadora e reconciliadora do Espírito neste mundo, porque nalgumas áreas este mundo aparece dividido, confrontado, submetido à idolatria do poder, do prazer e do dinheiro. O Espírito liberta-nos deste "eu" divino, para nos abrir a uma relação com o Pai e com os irmãos e irmãs: "Tudo vem de Deus, que nos reconciliou consigo por Cristo e nos confiou o ministério da reconciliação, pois foi Deus que, em Cristo, reconciliou o mundo consigo, não levando em conta as faltas dos homens e pondo nos nossos lábios a palavra da reconciliação". (2 Cor 5,18-19). A obra da reconciliação leva-nos às profundezas do amor e da misericórdia de Deus. Para além do regime da lei, a reconciliação introduz-nos no reino da graça, do júbilo e da amnistia total.
O reino da graça
O Espírito inunda-nos de alegria e de júbilo, anulando as dívidas e fazendo-nos esquecer as ofensas e os pecados ligados à nossa fragilidade, para que possamos ser verdadeiramente seduzidos pela força da gratuidade do amor, pelo seu dinamismo criador que tudo renova. Jesus, cheio do Espírito, proclama que a missão que empreende ultrapassa todos os cálculos e todas as expectativas. O Reino de Deus é o ano de graça, o ano jubilar perpétuo. Este é o projeto de Deus para a humanidade: "O Espírito do Senhor está sobre mim, porque Ele me ungiu. Enviou-me a levar a Boa Nova aos pobres, a proclamar a libertação aos cativos e a recuperação da vista aos cegos, a pôr em liberdade os oprimidos, a proclamar o ano de graça do Senhor". (Lc 4,18-19).
Estas palavras desvendam e apresentam um rosto de Deus que suscita admiração, surpresa e um sentimento de alegria e libertação, mas também desconforto e oposição naqueles que vivem uma religiosidade ritualista, formal, sujeita a regras muito rígidas que os impedem de se abrirem à novidade do Espírito: "Todos lhe davam testemunho e se maravilhavam com as palavras de graça que saíam da sua boca". (Lc 4,22).
Este ministério do Espírito que recebemos é um ministério de graça, de gratuidade. Trata-se de acolher o dom de Deus para que ele nos transforme, nos renove, numa palavra, de renascer: "Quem não nascer da água e do Espírito não pode entrar no Reino de Deus". (Jo 3,5). Nascer é doloroso, é certo, mas é fonte de alegria e de prazer" (Jo 16,21-22). É esta a grande obra do Espírito: ele é a fonte. É por isso que tudo é graça: "Da sua plenitude todos nós recebemos graça por graça". (Jo 1,16).
O cristão, e mais particularmente o padre, deve estar imbuído do Espírito Santo, possuído por ele porque recebeu um ministério espiritual. O Padre Chevrier descobriu e experimentou o que é o Espírito na vida do cristão e do padre. "Ter o Espírito de Deus é tudo. É tudo para si próprio. É tudo para uma comunidade. (VD 231). Poderíamos acrescentar: "Isso é tudo para um presbitério", para uma igreja local. Mais uma vez, o Padre Chevrier recorda-nos que o Espírito de Deus é o maior tesouro, o mais belo dom que Deus nos dá. Isto pressupõe que tenhamos a atitude de o receber e também de o pedir para nós e para os outros: "O Espírito de Deus... dá-lo a alguém é o maior tesouro que Deus lhe pode dar. E o maior tesouro de Deus na terra é dar o seu Espírito a certas pessoas para que outros o vejam, o consultem, o sigam e dele tirem proveito". (VD 229). Mais uma vez, somos chamados a pôr em prática e a dar vida a estas palavras do Padre Chevrier, tantas vezes lidas e meditadas, sobre o que devemos fazer para adquirir o Espírito de Deus: "Estudando o Santo Evangelho e rezando muito". (VD 227).
Xosé Xulio RODRIGUEZ FERNANDEZ